As escolhas de André Tomé
De Beja (e de quase todas as terras) se diz ser ”má mãe e boa madrasta”.
Não sei se é tanto a assim. Mas que culpa tem a cidade de, muito de vez em quando, lhe caírem no colo, filhos adotivos daqueles que todas as cidades gostariam de ter.
É o caso deste algarvio de Portimão, que veio para Beja, para coordenar o Centro Unesco para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial, e devia ser “condenado sem culpa formada” - embora com liberdade para desenvolver os interessantes projetos internacionais onde está envolvido - a ficar por cá, emprestando a esta cidade e região todo o seu potencial.
Falamos de André Tomé, nascido em Portimão, no ano de 1987, arqueólogo, formado na Universidade de Coimbra. É atualmente técnico superior da Câmara Municipal de Beja para as áreas do Turismo e Património. Coordenou entre 2017 e 2020 o Centro Unesco para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial - Beja. Responsável pelas linhas mestras deste projeto fundado em 2017, foi promotor de um intenso trabalho de salvaguarda, de criação de redes e de algo que o país e o Alentejo precisam: diálogo entre partes distantes, sejam elas partes de um movimento coral ou de aldeias fraturadas. Acredita que a cultura e o património como extensões das comunidades vivas e dos seus tesouros humanos e materiais, devem ser a trave mestra do desenvolvimento das regiões interiores.
Como arqueólogo participou em projetos na Síria e em Angola. Co-dirige desde 2013 o projeto internacional arqueológico de Kani Shaie, no Iraque. Encontra-se ainda a terminar o seu doutoramento na mesma área de estudo pela Universidade de Coimbra, onde foi Assistente convidado entre 2011 e 2017 lecionando no curso de Arqueologia e História. É ainda membro ativo do Centro de Estudos em Arqueologia, Artes e Património.
Como poeta tem três livros publicados, o último intitulado Tabernáculo, publicado com a editora Artefacto foi apresentado recentemente em Lisboa pela escritora Alexandra Lucas Coelho. Em Beja, este Tabernáculo tem a apresentação prevista para Novembro.
Mas por muito interessantes que sejam todos estes projetos, e são, o que nós queremos saber do nosso convidado é da sua relação com a música.
E ela, a música, diz André Tomé, está sempre presente na sua vida, seja como prática ou como paisagem.
Diz que gostava de ter sido músico porque é talvez a arte maior.
Ouve-a regularmente porque sente que faz parte desse processo, sentindo-se a extensão do criador.
Ilustra o que quer dizer com uma frase muito bonita do Arvo Pärt, um grande compositor clássico contemporâneo que traduz muito bem essa sensação: “A minha música é similar à luz branca, apenas quando passa através de um prisma se divide e aparecem todas as suas cores. Esse prisma é o espírito de cada ouvinte.”
Diz que a música o ajuda nas tarefas mais rotineiras, porque é um instrumento de concentração, mas, paradoxalmente, em certos momentos, ensina-o também a flutuar, a dispersar à procura de outra coisa diferente da realidade concreta. Assegura que, de alguma forma a vinda para o Alentejo e o contacto com o Cante que já admirava tornou-o ainda mais apaixonado por esta arte que acaba por ser a própria vida.
Há uns anos entenderia isso como um simples chavão, mas depois de ter adotado o Alentejo como casa, física e espiritual, percebeu que faz todo o sentido que a música possa e deva estar em toda a parte.
Usa sobretudo o Spotify, tanto em casa como no carro. O vinil é mais esporádico, ainda tenho uma coleção pequena.
A ocasião em que ouve mais música é sobretudo a trabalhar.
Numa época pré-covid assistia regularmente a concertos ao vivo, agora a retoma está ainda lenta, mas espera recuperar o ritmo em breve.
Sufjan Stevens, um cantautor e multi-instrumentalista americano, e os Radiohead estão entre os seus intérpretes favoritos, mas para uma ilha deserta, se só pudesse escolher um, talvez levasse a discografia da banda inglesa.
Sempredifícil é a tarefa de escolher um tema favorito recaindo a escolha em “Stabat Mater” do Arvo Pärt.
Num fim de semana que já vai convidando ao recolhimento aproveite a playlist que o André Tomé fez para os seguidores do “O Atual”