BEJA NOS PRIMEIROS DIAS APÓS O 25 DE ABRIL DE 1974 (I)
A fazer fé no Diário do Alentejo (DA), de 26 de abril de 1974, Beja recebe a notícia do golpe militar de 25 ade abril com alegria, entusiasmo e expetativa, mas sem alterações da ordem pública. O governador civil, Fernando Nunes Ribeiro, passa o dia no seu gabinete, o mesmo acontecendo ao presidente da Câmara Municipal, José Dias Cara Nova Júnior. A grande alteração na fisionomia da cidade só acontece depois de almoço, com o encerramento do comércio e das instituições bancárias.
Só a 26 de abril é que começam a sentir-se alterações na vida política de Beja, as quais se desenvolvem e aprofundam nos dias seguintes em resultado da deliberação da Junta de Salvação Nacional em demitir os Presidentes da República e do Conselho, os membros do Governo, os governadores das colónias, das regiões autónomas e os governadores civis e extinguir a PIDE/DGS, a Ação Nacional Popular ANP), o partido único do regime que antes de Marcelo Caetano se chamava União Nacional, a Legião Portuguesa e as organizações juvenis oficiais como a Mocidade Portuguesa.
O coronel Romão Loureiro, do Regimento de Infantaria sediado na cidade, é nomeado representante da Junta de Salvação Nacional, liderada pelo general António de Spínola, assumindo as funções de comandante das forças militares de Beja. Assim, é sob o seu controle que, a 26 de abril, Fernando Nunes Ribeiro é destituído do cargo de Governador Civil, passando o próprio a pasta ao seu substituto, Adriano Gonçalves da Cunha, uma vez que não se encontravam ocupados os cargos de primeiro e segundo secretário. Na cerimónia em que o Governador Civil demitido entrega as chaves do Governo Civil ao substituto estão presentes, para além do coronel Romão Loureiro, os presidentes de câmara do fascismo português, os quais, por enquanto continuam em funções.
Esta cerimónia é bem reveladora de duas coisas. A primeira tem a ver com o carácter pacífico em que se desenvolve o golpe militar, aspeto bem demonstrativo da situação de apodrecimento e degradação do próprio regime. A segunda prende-se com a atitude das figuras locais do fascismo português, as quais estavam bem longe de imaginar a revolução popular que viria poucos meses depois. As forças militares, que estavam a fazer o golpe de Estado, tinham sido sempre um dos pilares do regime e o nome de António de Spínola, bem como a composição da Junta de Salvação, pareciam dar a garantia que se alguma coisa mudasse não seria, assim, algo de muito profundo.
As coisas estão tão calmas em Beja que a PSP da cidade, a 26 de abril, ainda não tinha tomado consciência da queda do regime e da extinção da PIDE/DGS. A vítima deste “estado de alma” é o conhecido cauteleiro da cidade, José António Ciríaco, que se passeia pelas ruas de Beja, na sua cadeira de rodas motorizada, exibindo um cartaz onde reclama a extinção da polícia política do regime. Preso pela PSP por este facto, só é libertado pela ação de um oficial do MFA do Regimento de Infantaria de Beja.
Dissipadas as dúvidas em relação aos objetivos do golpe militar, os democratas de Beja, conjunto de figuras oposicionistas ao regime ligados entre si numa estrutura informal, que adquiria um carácter mais formal aquando da realização dos processos eleitorais, caso das eleições de 1969, onde pontificava a figura do advogado Celso Galvão Pinto de Almeida, reúne em plenário, também a 26 de abril, onde aprovam um documento onde saúdam a Junta de Salvação Nacional por ter derrubado o governo fascista, libertado os presos políticos, abolido a censura, extinguido a PIDE/DGS e dissolvido a ANP e a Legião Portuguesa.
Esta é a primeira reunião dos democratas de Beja, a qual está na origem na organização do Movimento Democrático Português (MDP), peça fundamental na evolução política de Beja, do concelho e do distrito, nos dias e meses posteriores a 25 de abril de 1974.