HOMENAGEM A CATARINA EUFÉMIA. A RELIGAÇÃO DO PCP COM A TRADIÇÃO DE LUTA DOS ASSALARIADOS RURAIS ALENTEJANOS
No espaço de liberdade que o golpe militar do 25 de Abril de 1974 possibilita criam-se novos partidos políticos e reorganizam-se os que vinham da clandestinidade e do combate à ditadura estado novista. Neste último grupo está o Partido Comunista Português (PCP) que logo a 26 de abril, muito antes de ter decidido se sairia da clandestinidade ou não, já, em Pias, tem uma sede aberta, a primeira em todo o país. É, no entanto, na homenagem a Catarina Eufémia, a 19 de maio de 1974, organizada formalmente pelo Movimento Democrático das Mulheres (MDM), que o PCP faz a sua religação às tradições de luta dos assalariados rurais alentejanos, ponto de partida para a sua implantação em crescendo no Alentejo em geral e no distrito de Beja em particular.
A ideia de sinalizar o 20.º aniversário do assassinato de Catarina Eufémia pela GNR, na pessoa do tenente Carrajola, nasce em Baleizão protagonizada por uma comissão de democratas e antifascistas da localidade. No entanto, esta comissão é rapidamente ultrapassada pelo MDM, estrutura com ligações ao PCP que, através da sua Comissão Coordenadora, anuncia, a 9 de maio, em Lisboa, na sede do MDP, um conjunto de iniciativas de âmbito nacional de homenagem a Catarina Eufémia, entre as quais uma concentração em Baleizão e uma romagem à sua campa, na altura em Quintos.
É, pois, no contexto desta iniciativa que, no dia 19 de maio de 1974, se deslocam a Baleizão milhares de pessoas vindas de todo o Alentejo, Algarve e da chamada cintura industrial de Lisboa. O Largo da Fonte do Terreiro, no centro da aldeia velha de Baleizão, onde se realiza o comício, não só se enche completamente de pessoas como a multidão se espalha por cerca de um quilómetro deste local. Autocarros, automóveis e tratores com os seus atrelados fazem fila por quilómetros.
São oradores no comício Francisco Miguel Duarte, natural de Baleizão e membro do comité central do PCP, Miguel Urbano Tavares Rodrigues e Urbano Tavares Rodrigues, irmãos, naturais de Moura e membros do PCP, e o coronel Romão Loureiro, Governador Civil nesta data, que vinha sendo o delegado no distrito da Junta de Salvação Nacional, entretanto extinta com a tomada de posse do I Governo Provisório, a 16 de maio, chefiado por Adelino da Palma Carlos. Álvaro Cunhal, secretário-geral do PCP e ministro sem pasta, que surge inesperadamente, discursa também no comício onde é recebido de forma apoteótica.
Depois da sede aberta em Pias, na capital do Baixo Alentejo, a 4 de maio, realiza-se a primeira reunião pública de dirigentes e simpatizantes do PCP. A homenagem a Catarina Eufémia apanha, assim, o partido em fase de organização e implantação, servindo esta de espécie de “mola propulsora” ao crescimento desta formação política. Na última semana de maio já tem sede aberta, em Beja, na rua da Ancha, onde tinha estado instalada a pensão “Pátio Alentejano”, que ainda hoje mantém, e dia 1 de junho realiza-se o primeiro comício do partido em Beja, o qual tem lugar na praça de touros, contando com a presença de Pedro Soares e Domingos Abrantes, ambos do comité central do PCP, sendo o primeiro natural de Trigaches e antigo aluno do Liceu Nacional de Beja, e João Honrado. A este comício outros se seguem em Pias e Aljustrel. É a caminhada do PCP para a hegemonia política no Baixo Alentejo, iniciada a partir das localidades onde o partido manteve alguma organização até às vésperas do 25 de Abril de 1974.
Baleizão, homenagem a Catarina Eufémia, 19 de maio de 1974
Fotografia: Maria Vitória S.P. Nobre