INSTITUÇÕES DA ECONOMIA SOCIAL
A PONTA DO ICEBERGUE
As alterações que se têm verificado na estrutura e funcionamento interno
das famílias, a par de outros fenómenos, em particular do aumento da esperança
média de vida, por vezes acompanhado de um decréscimo dos níveis de autonomia,
são aspetos que no seu conjunto têm contribuído para um incremento dos serviços
de apoio social e de saúde, de um modo geral organizados no âmbito da
denominada Economia Social.
Por todo o país e em particular na nossa região, e a par de organizações como as seculares misericórdias, emergiram nas últimas décadas inúmeras associações que têm levado a cabo um meritório trabalho de intervenção social, em domínios como a infância, a deficiência ou a terceira idade.
Para além do apoio aos utentes e suas famílias, estas IPSSs – Instituições Particulares de Solidariedade Social, têm vindo a afirmar-se como importantes estruturas de desenvolvimento dos territórios locais, não só pela criação de um considerável número de postos de trabalho, mas também porque a relação de cada uma destas entidades com outros agentes locais, tem permitido a reativação desses espaços, numa dinâmica que extravasa o social, influenciando positivamente dimensões como a demografia ou a economia. O agora aparentemente inovador conceito de Economia Circular, há muito que acontece por esse país fora pela mão destas entidades.
O modelo de financiamento das IPSSs assenta quase em exclusivo nas receitas oriundas do Estado, por via de Acordos de Cooperação celebrados com o ISS- Instituto da Segurança Social, e ainda da comparticipação dos utilizadores das diferentes respostas socias. Nos anos noventa, cerca de 50% das receitas destas instituições provinham do Estado. Atualmente, e no caso de algumas associações, as receitas públicas rondam os 30%.
Talvez isso justifique o facto de até há anos a esta parte, a maioria destas entidades apresentar uma situação financeira e económica estável. No entanto e nos últimos anos, esse equilíbrio alterou-se, já que, e do lado das despesas, se verificou um gigantesco acréscimo de despesas com pessoal, (apesar do baixo nível salarial auferido pela esmagadora maioria dos trabalhadores), tendo ainda disparado os custos com outras despesas de exploração desses equipamentos e respostas, (seguros, equipamentos de segurança, gás, eletricidade, géneros alimentares, entre outros,) e por outro lado, porque as atualizações das comparticipações do ISS não acompanharam minimamente estes e outros custos acrescidos, que será conveniente referir, foram, e nalguns casos, impostos por quem nos últimos anos não tem estado à altura das suas responsabilidades, nomeadamente constitucionais: o Estado.
As recentes notícias vindas a público de algumas IPSSs em sérias dificuldades económicas, nomeadamente com salários em atraso, é apenas a ponta do icebergue. Se os Acordos de Cooperação não forem atualizados de acordo com o que próprio Estado se comprometeu em 1995 quando implementou o modelo em vigor, muitas outras organizações entrarão em rutura. É apenas uma questão de tempo.
Um pouco por todo o lado, mas sobretudo no interior do país, quem ficará a perder são as pessoas que necessitam de apoio, as suas famílias e os territórios como um todo, com a perda de centenas de empregos e de dinâmicas socioeconómicas. Talvez fosse tempo do tal Ministério da Coesão Territorial (que ainda não percebi muito bem para que serve), se interessasse por esta matéria.