O RSI – Rendimento Social de Inserção

A época eleitoral que se vive é propicia ao mediatismo, não necessariamente ao debate sério e rigoroso, das questões sociais. Temas como as pensões, a habitação ou os apoios sociais, saltaram ou saltarão para a ribalta. De entre estes últimos, o RSI – Rendimento Social de Inserção, costuma ser dos mais referidos, e certamente terá na direita, (a que se assume como tal e a que tem vergonha de dizer que o é), um dos seus bombos de festa, assim como outros chavões da moda.

A situação não é nova. Nem do ponto de vista geográfico nem temporal. De facto, na Alemanha, França, Itália, Grécia ou Espanha, e só para citar alguns casos, a intolerância face a pessoas de outras nacionalidades, etnias, religiões ou condição socioeconómica, marca o debate público nessas sociedades, dando protagonismo e força institucional a movimentos que, nalguns casos, ultrapassam todos as normas legais e princípios dos Direitos Humanos. Assim foi no final dos anos trinta do século passado, e “deu no que deu”. Assim o é agora.

Outro traço comum desses fenómenos é a intolerância, e nalguns casos o ódio, contra as pessoas pobres. Em Portugal, durante o fascismo o regime catalogava os “miseráveis”, em “bons” e “maus pobres”. Os primeiros eram os que de alguma forma tinham sido atingidos pelo infortúnio da desgraça, os segundos, a esmagadora maioria, eram pobres porque queriam, os “parasitas”. Aliás, nos anos quarenta e cinquenta do século XX, a “tendência das mulheres para o luxo” e as “mancebias taradas de muitos homens”, justificavam, aos olhos do regime, a existência de uma população faminta e desprovida do essencial.

 A direita, (a que se assume e a que tem vergonha de dizer que o é), do ponto de vista ideológico e relativamente às questões sociais, continua no final do séc. XIX. O livre funcionamento do mercado dá oportunidade a todos. Aqueles que não prosperam são parasitas do sistema. O que agora escrevo pode parecer, numa análise superficial, exagero. Mas não é: basta ver os pseudoargumentos de algumas pessoas e partidos relativamente ao RSI, para perceber, que afinal, está tudo na mesma.

Os dados que a seguir enuncio, tem por base um estudo científico levado a cado por um grupo de investigadores do ISCTE, publicado em 2020, e desmonta, “tim-tim por tim-tim”, alguma ignorância e muito do ódio relativamente aos beneficiários do RSI, que, talvez valha a pena recordar, abrange só, os mais pobres dos pobres, uma vez que apenas são integráveis (no caso de um adulto só), os indivíduos com um rendimento mensal não superior a 237,25 euros, (valor em 2024).

Um dos mitos que esse estudo coloca a nú é o de que “cada vez há mais pessoas a receber o RSI”. Em 2010, havia 525 577 beneficiários, em 2020 (último ano tratado no estudo em apreço), eram 249 192. Outro pseudoargumento utilizado é a de que o “Estado gasta muito com o RSI”. Em 2010, o Estado gastava com o RSI cerca de 1,55% do orçamento da Segurança Social, em 2020, rondava os 0,9%.

Um dos principais veículos de propagação destas correntes de opinião, são as redes sociais. O Facebook, por exemplo, tem nos últimos dias sido inundado por uma fotografia de um carro de alta cilindrada num acampamento, encimado por um pequeno texto com claros propósitos de propagação de sentimentos xenófobos e racistas, onde se pode ler: “recebe o RSI e têm um mercedes à porta”.

Ora acontece, que esse mesmo estudo demonstra que em 2019, o valor médio de RSI relativo um indivíduo só era de 85 euros nos Açores, (valor mais baixo), e de 132 euros em Coimbra (valor mais elevado). A título de curiosidade, no distrito de Beja, esse montante cifrava-se em 116 euros. E porque é que estes valores são mais baixos relativamente aos 237,25 euros acima referidos? Porque muitos dos beneficiários têm pequenos rendimentos do trabalho (cerca de 10% em 2019), sendo-lhe depois descontado esses rendimentos na prestação, ou ainda porque integram agregados familiares, e se o requerente da prestação tem direito, se não tiver outros rendimentos, aos tais 237,25 euros por inteiro, a/o esposa/esposo já só tem direito a 70% desse montante, e os filhos menores, a 50%.

O que a direita, (a que se assume como tal e a que tem vergonha de dizer que o é), nunca diz, é que para além da componente pecuniária, que e como se vê, é pouco mais do que miserável, o RSI tem também uma componente de Inserção, onde os beneficiários têm que cumprir com um conjunto de deveres, sob pena de serem penalizados, em que, em última instância, deixam de receber os apoios monetários. Deturpar a realidade ou omitir parte da mesma, são duas das formas mais utilizadas para mentir. Nomeadamente em tempo de eleições.

Quanto ao estudo que faço referência, o mesmo é público e pode ser consultado aqui:

https://www.colabor.pt/numeros-em-analise/rendimento-social-de-insercao-contributos-para-o-conhecimento-de-uma-prestacao-de-ultimo-recurso

 

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