Há vidas assim...

Há vidas assim...

Hoje, afastado da vida política ativa, é administrador de uma grande empresa que favoreceu enquanto governante, atividade que acumula com a de influenciador de decisões político-administrativas alinhadas com os interesses que representa.

Ele nunca foi bom aluno. Fez o secundário com dificuldade, pelo que ensino superior só numa universidade privada, daquelas que proliferaram no início deste século com cursos instantâneos, fornecidos com base em histórias de vida. Foi o que aconteceu, cursando direito num destes estabelecimentos de ensino, repartindo o seu tempo entre a “borga” e a frequência da “jota” do partido de direita do chamado arco da governação que toda a comunicação social teima em apelidar de centro / direita.

Obtido o certificado do curso, já no exercício do cargo de presidente da “jota” do seu distrito, facilmente arranjou emprego como assessor político de um dos presidentes de câmara do seu partido. E aqui, no exercício desta função, aprendeu tudo o que havia a aprender sobre a arte de ganhar e manter o poder e dar-se “bem na vida”. Percebeu a importância, para uma vida política bem-sucedida, do controle de uma rede clientelar constituída por pessoas singulares e coletivas, construída através da oferta de empregos e da atribuição de subsídios vários. Viu como se estabelecem contactos com vantagens pessoais mútuas quer com os poderes económicos da região, quer com os membros do partido com influência direta na governação e, sobretudo, aprendeu os caminhos escusos de singrar na hierarquia partidária onde cada correligionário deveria ser visto como um rival, abatido sem contemplações, mas com hipocrisia, sempre que daí resultasse vantagem pessoal.

Munido destes ensinamentos foi-lhe fácil, através de um golpe palaciano, afastar da corrida eleitoral o presidente que assessorava, sucedendo-lhe como cabeça de lista e ser eleito sem dificuldade presidente de câmara. Neste seu novo desempenho político aumentou e consolidou a rede clientelar, agora também ao serviço da sua afirmação no interior da formação política a que pertencia, o que lhe permitiu, ao fim do primeiro mandato como presidente de câmara, ser eleito o dirigente máximo da distrital do seu partido, acontecimento em que foi decisivo o enorme número de votos que obteve dos aderentes residentes no seu concelho a quem pagou as quotas antes da elaboração definitiva dos cadernos eleitorais.

Nesta qualidade de líder distrital escolheu-se a si próprio cabeça de lista na disputa eleitoral que se seguiu para o Parlamento, o que lhe valeu a eleição como deputado. Apesar da vaidade que sentia do seu estatuto de representante do povo e embora não tivesse qualquer competência técnica, a sua grande aspiração era vir a ser membro do governo, ter automóvel de função e motorista à disposição. O seu desejo tornou-se realidade no contexto da última remodelação ministerial quando o novo ministro das Obras Públicas o escolheu para secretário de Estado Adjunto do Ministro como paga dos favores que lhe tinha prestado na qualidade de presidente de câmara, sendo ele o principal administrador de uma das grandes empresas de construção civil do país.

Hoje, afastado da vida política ativa, é administrador de uma grande empresa que favoreceu enquanto governante, atividade que acumula com a de influenciador de decisões político-administrativas alinhadas com os interesses que representa

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