Aeroporto de Beja acolhia "ampla estrutura" de rede internacional de tráfico de droga
A rede de tráfico de cocaína desmantelada pela Polícia Nacional (PN) espanhola e pela Polícia Judiciária tinha no aeroporto de Beja uma “ampla estrutura”, onde operava “uma rede de funcionários corruptos” liderada por um cidadão português, segundo a PN.
Em comunicado divulgado na sua página oficial, a PN revela que a rede criminosa agora desmantelada, denominada de ‘Narcos (traficantes) do céu’, recorria a voos de jatos privados fretados para o transporte de cocaína, proveniente de diversos pontos da América do Sul, com destino a aeroportos europeus, como o de Beja, em Portugal, mas também no Reino Unido. O alegado esquema criminoso envolveu transporte marítimo, usando contentores de carga para dissimular cocaína em direção a portos espanhóis.
Segundo o comunicado, após meses de investigação, foi possível confirmar que a rede de tráfico tinha acesso a vários aeroportos europeus como ponto de entrada dos carregamentos de cocaína, “encontrando-se um deles na localidade portuguesa de Beja”.
“Ali a rede contava com uma ampla estrutura, razão pela qual os seus membros realizavam numerosas deslocações a Portugal”, adianta o comunicado.
“No passado mês de janeiro, a PN e a Polícia Judiciária (PJ) realizaram uma operação conjunta que permitiu identificar uma rede de funcionários corruptos que operavam sob a liderança de um cidadão português, no aeroporto comercial de Beja. Nessas datas, os agentes tiveram conhecimento de que a organização tinha enviado o seu primeiro avião fretado a partir de Barranquilla, Colômbia, em direção ao aeroporto de Beja, a bordo do qual se encontravam vários dos seus membros, assim como pilotos contratados para o efeito”, lê-se no comunicado.
A PN adianta ainda que nessa ocasião não foi possível à rede criminosa carregar o avião com droga, o que se traduziu num prejuízo superior a 500 mil euros para a organização.
Os suspeitos mantiveram o plano de enviar para a Europa quase duas toneladas de cocaína por voos privados, mas para “poder recuperar economicamente da perda e financiar a operação, assim como para manter o seu nível de vida, mudaram o seu ‘modus operandi’”, optando por operações de “menor envergadura”, enviando malas de cocaína a partir de vários países em direção ao aeroporto de Barajas, em Madrid.
Foram detetados pela investigação quatro envios com recurso a este método ao longo de um ano: setembro de 2023 (16,5 quilos de cocaína), março de 2024 (31 quilos), abril de 2024 (60 quilos) e setembro de 2024 (20 quilos).
Em maio deste ano, foram encontrados 344 quilos de cocaína escondidos no chão de um contentor carregado de abacates proveniente do Peru com destino ao porto de Barcelona, tendo o carregamento sido intercetado antes de chegar às mãos da rede de tráfico.
“Em junho de 2024, os suspeitos realizaram uma segunda tentativa para transportar droga num avião privado. Depois de conseguirem financiamento de vários investidores externos no México, fretaram um avião particular em Joanesburgo, na África do Sul, até à República Dominicana, onde devia ser carregado o estupefaciente para ser transportado para o Reino Unido. Tal como na primeira tentativa, problemas logísticos impediram o carregamento”, detalhou a PN.
Face às contrariedades sofridas nas operações falhadas, a organização criminosa recorreu a novas fontes de financiamento que lhes permitisse pagar despesas diárias, a droga e a logística.
A polícia identificou várias formas utilizadas pela rede de tráfico para dar cobertura às suas operações financeiras e logísticas, entre as quais o recurso a empresas que trabalham com criptomoedas para converter os ganhos com as operações de narcotráfico em moeda legal, mas também a utilização de redes informais de envio de dinheiro.
Segundo a investigação, a rede recorria a serviços desta natureza para financiamento, sobretudo a empresários de origem chinesa, “com capacidade económica suficiente e com uma estrutura que operava a nível mundial” para realizar transações à margem do sistema financeiro legal, recorrendo ao sistema informal denominado Hawala.
A investigação, que durou 15 meses, teve início em junho de 2023, quando a PN e a agência norte-americana de combate ao tráfico de droga (DEA), iniciaram uma investigação conjunta às atividades de um cidadão colombiano residente em Madrid, que alegadamente liderava uma grande rede de tráfico de droga, tendo a investigação fixado a atenção, numa fase inicial, num café no bairro de La Moraleja, frequentado pelos investigados e ao qual estes se referiam como “o escritório”, por ser onde decorriam as organizações dos membros da rede.
Segundo o comunicado hoje divulgado pela PJ sobre a operação em Portugal, denominada Operação Fóssil, a cargo da Unidade Nacional de Combate ao Tráfico de Estupefacientes e realizada em conjunto com a polícia espanhola e com o apoio da Europol, resultou na detenção de seis pessoas, na realização de nove buscas domiciliarias e, ainda, na apreensão de vários bens, nomeadamente, cinco automóveis de gama alta, elevadas quantias de dinheiro em numerário, material informático, documentação e pequenas quantidades de droga e anabolizantes.
Em Portugal, a operação iniciou-se na sequência de troca de informação no âmbito da cooperação policial internacional, resultando num mandado de detenção europeu, que permitiu à PJ proceder à detenção do principal responsável da rede criminosa que operava em território nacional e importava droga para o continente europeu.
A PJ acrescenta que este suspeito, conhecido pelas autoridades policiais portuguesas, é reconhecido internacionalmente como sendo um “High Value Target”, ou seja, um suspeito de elevada relevância criminal no submundo do tráfico ilícito de estupefacientes.
No total, em Portugal e Espanha, foram detidas 25 pessoas de diversas nacionalidades.