Agricultura sustentável do Campo Branco em busca de novos mercados
Sem acesso à água do Alqueva e com as alterações climáticas a causarem mais problemas, os agricultores do Campo Branco estão a trabalhar em busca de novos “nichos” de mercado para valorizarem as suas produções.
Nesta região, que abrange os concelhos alentejanos de Castro Verde e Almodôvar e parte dos de Aljustrel, Mértola e Ourique, predominam a pecuária extensiva e cereais de sequeiro, produzidos de forma sustentável e “amiga do ambiente”.
No horizonte surge agora a produção de trigo destinado à alimentação para bebés, com pouca utilização de pesticidas, num projeto do agrupamento de produtores “Carnes do Campo Branco” e que está ainda em “fase embrionária”.
“Esse nicho de mercado exige trigos produzidos com pouca pressão de pesticidas e que tenham alguma qualidade, inseridos no sistema de sequeiro”, explica à agência Lusa o agricultor António Colaço, que faz parte do conselho de administração do agrupamento de produtores, com sede em Castro Verde.
Ou seja, “estamos a tentar aproveitar o que é exigido, visto que a região se encaixa naquilo que são as exigências da ‘baby food’ [comida para bebés]”, acrescenta.
O projeto não é inédito no país e está ainda numa fase prematura, mas já provoca entusiasmo entre os produtores agrícolas da zona.
“Pode ser uma nova janela” de oportunidade, “porque estamos a ver que realmente começam a estar à procura de produtos biológicos ou com menos concentrados de pesticidas”, reconhece o também agricultor Fernando Rosa.
A tentativa de encontrar novos “nichos de mercado” é cada vez mais uma preocupação para a agricultura do Campo Branco, que, por ser de sequeiro, é menos rentável do que o regadio. Não só em termos de produção, mas também de valorização.
Além disso, a região é abrangida pelo Apoio Zonal de Castro Verde, medida agroambiental criada em 1995, no âmbito da Política Agrícola Comum (PAC).
Este apoio visa promover a conservação da natureza e avifauna no Campo Branco - onde existe uma Reserva da Biosfera da UNESCO - e, em simultâneo, minimizar as perdas de rendimento agrícola decorrentes de técnicas culturais e de gestão compatíveis com a conservação da natureza.
Tudo isto levou a Associação de Agricultores do Campo Branco (AACB), de Castro Verde, e a Escola Superior Agrária de Beja (ESAB) a criarem, há oito anos, Campos de Ensaio e Experimentação de Cereais de Inverno, Fenossilagens, Leguminosas e Pastagens Melhoradas.
O projeto, em duas herdades de Castro Verde, veio colmatar “a falta de informação” dos agricultores sobre novas variedades e espécies e sobre fertilizantes e pesticidas.
Isso permite uma valorização das explorações “em termos de produção e económicos”, revela António Colaço, um dos representantes da AACB na equipa técnica dos campos de ensaio.
A ambição “é demonstrarmos aqui aquilo que existe no mercado”, para que o agricultor “possa ver, comprar e fazer nas suas explorações”, acrescenta.
Este trabalho ganha maior projeção devido às alterações climáticas, que são uma evidência na região, com cada vez maiores períodos de seca e temperaturas acima do habitual ao longo do ano agrícola.
“Com as alterações climáticas” é preciso “usar as variedades mais adaptadas”, pelo que “faz todo o sentido que essa experimentação seja realizada”, observa à Lusa Manuel Patanita, professor na ESAB e coordenador científico dos campos de ensaio.
Este projeto, vincou, permite avaliar “a capacidade de adaptação” e identificar "os fatores de produção mais adequados” para os “solos pobres” locais, “com baixa matéria orgânica e muito suscetíveis à desertificação”.
“Acresce a necessidade de fazer esta investigação e experimentação, para que os agricultores possam ter mais soluções e mais conhecimento para apoiar a sua decisão”, diz o professor.
No caso dos cereais, o trabalho dos campos de ensaio assenta em variedades cujo “período de enchimento do grão seja mais curto”, para permitir “fugir um bocadinho ao stress hídrico” da primavera, adianta José Dores, também membro da equipa técnica.
Depois, “em termos de forragens”, pretende-se trabalhar espécies “com um bom desenvolvimento, rápido no início, para podermos ter biomassa” e “verificarmos quais são as que se adaptam melhor”, completa este professor da ESAB.
No fundo, estamos a “tentar criar soluções, de alguma forma inovadoras para a região, para os agricultores poderem usufruir desses trabalhos”, conclui.