Beja: Troço de muralha da Idade do Bronze em excelente estado “surpreende” arqueólogos
Hoje terminam as escavações deste ano no povoado do Outeiro do Circo, em Beja, da Idade do Bronze, que permitiram revelar que o segundo troço da muralha tem técnicas construtivas “engenhosas” e está num “excelente estado” que “surpreendeu” os arqueólogos.
A campanha de 2021 no povoado, perto da cidade de Beja e “um dos maiores da Idade do Bronze Final da Península Ibérica”, visa concluir os trabalhos desenvolvidos desde 2019, explicou hoje à agência Lusa o diretor científico das escavações, Miguel Serra.
Aqueles trabalhos permitiram descobrir o segundo troço da muralha e novos dados relacionados com a ocupação durante a Idade do Ferro.
Segundo Miguel Serra, as escavações, que arrancaram no dia 02 deste mês e terminam na sexta-feira, revelaram que o segundo troço da muralha está em “excelente estado de conservação”, o que “surpreendeu” os arqueólogos.
O estado de conservação do troço deve-se ao facto de estar numa zona do sítio “em melhores condições de preservação e que não foi afetada por trabalhos agrícolas”, ao contrário do que aconteceu com o primeiro troço, a cerca de 20 metros e escavado entre 2008 e 2013.
O segundo troço, com cerca de oito metros de comprimento e três de largura, “apresenta uma estrutura e soluções construtivas engenhosas com 3.000 anos”, como plataformas de terra batida, rampas de barro cozido e muros de pedra com possíveis paliçadas, explicou.
A estrutura e algumas soluções construtivas deste troço são diferentes das do primeiro, o que mostra que a muralha, que tem quase dois quilómetros e rodeia o sítio quase totalmente, “não foi um projeto estático”, mas sim “dinâmico”.
De acordo com o arqueólogo, sofreu “várias intervenções ao longo da sua vida” e “teve diferentes fases, todas associadas às comunidades da Idade do Bronze”.
“Mostra também uma grande capacidade de construção das comunidades da Idade do Bronze e as capacidades que tinham para encontrar soluções pragmáticas para venceram as dificuldades que o terreno lhes apresentava”, acrescentou.
Tal como em 2020, a campanha deste ano também inclui escavações numa zona no interior do sítio e que estão a permitir “ver outras dinâmicas de época posterior”, nomeadamente da Idade do Ferro.
Ou seja, “uma presença maior de vestígios materiais, sobretudo cerâmicas” – outros já tinham sido achados em 2020 - e uma estrutura que os arqueólogos ainda não conseguiram “perceber muito bem”, precisou.
A estrutura, “um alinhamento de pedras paralelo à muralha e colmatado com barro cozido”, ainda está a ser escavada, mas “parece ser cada vez mais claro” que é da Idade do Ferro.
Até agora, esta época “estava muito mal documentada no Outeiro do Circo”, onde “apenas” tinham sido descobertos “alguns materiais residuais”, mas as descobertas permitem “ver que o sítio, afinal, após o abandono na Idade do Bronze Final, terá sido reocupado, mesmo que pontualmente”.
O espólio recolhido terá de ser estudado para se “compreender melhor” o “modo de vida das comunidades da Idade do Bronze” e “as várias dinâmicas” no sítio, indicou.
Segundo Miguel Serra, a atual campanha de escavações é a última do projeto de investigação financiado pela Câmara de Beja que começou em 2019 e vai acabar com um colóquio a realizar até final deste ano, nesta cidade.
Depois, será preciso fazer um ano de pausa nas intervenções de campo para “estudar” o espólio recolhido e as descobertas feitas e, em conjunto com o município, “pensar a futura investigação e analisar a melhor forma de dar continuidade ao projeto”, rematou.
O Outeiro do Circo, com cerca de 17 hectares, terá sido o grande centro de poder regional antes da cidade de Beja, que se desenvolveu a partir da Idade do Ferro, no século VII a.C. (antes de Cristo).
O sítio é conhecido desde o século XVIII, foi alvo de um primeiro estudo científico em 1977 e tem sido alvo de trabalhos arqueológicos desde 2008 e até este ano, no âmbito de vários projetos de investigação.