Depois de apreendidas em 2019 pela Polícia Judiciária (PJ) à família Ançã, que as detinha e tentou vender, as cartas foram entregues, em 30 de abril de 2021, pelo Ministério Público (MP) à Câmara de Beja, disse hoje à agência Lusa o presidente do município, Paulo Arsénio.

Entretanto, a família interpôs recurso da decisão do MP junto do TRE, que decidiu que as cartas devem “manter-se na posse dos herdeiros” daquela família “até uma eventual definição judicial sobre a propriedade” dos “importantes documentos históricos”, referiu o autarca.

O MP concluiu que as cartas são verdadeiras e que devem estar na posse da Câmara de Beja, mas o TRE concluiu que “a posse é da família até prova em contrário por parte do município”, explicou.

Paulo Arsénio informou que a autarquia, “cumprindo” a decisão e “respeitando as indicações e os prazos” do TRE e “sob pena de incorrer em crime de desobediência caso não o fizesse”, devolveu as cartas régias, na terça-feira, à cabeça de casal dos herdeiros da família.

Na decisão, o TRE sugeriu que o município, se quiser, pode reclamar a posse das cartas, “através dos meios civis à sua disposição”, indicou o autarca, frisando que são “documentos administrativos de valor histórico inestimável e de fundamental importância para o município”.

Por isso, adiantou, a câmara vai “estudar com atenção” a decisão do TRE e “avaliar a possibilidade” de avançar com uma ação cível, junto do Tribunal Judicial de Beja, para reaver as cartas.

A Câmara de Beja terá de provar que é a legítima proprietária das cartas, o que será “muito difícil”, admitiu, frisando tratar-se de documentos dos séculos XVII e XIX e que o município “não faz ideia” de como terão chegado à posse da família Ançã.

Segundo a PJ, trata-se de "um códice factício constituído por 165 documentos, em bifólio de papel, manuscritos entre os anos 1623 e 1806, contendo maioritariamente cartas originais enviadas em nome do 'Rei', do 'Príncipe', do 'Infante' e da 'duquesa de Mântua' e endereçadas a figuras ilustres da cidade de Beja".

Em 04 de outubro de 2019, a PJ anunciou ter apreendido as cartas régias à família Ançã, no âmbito de uma investigação aberta após a Câmara de Beja ter levantado dúvidas sobre o seu eventual descaminho do espólio do Estado.

Em declarações à Lusa na altura, o diretor da PJ do Sul, António Madureira, disse que a família Ançã tentou vender as cartas pelo menos duas vezes e por 20 mil euros, uma à Câmara de Beja e outra à Direção-Geral do Livro, Arquivos e Bibliotecas, tendo contactado ainda uma leiloeira.

Segundo António Madureira, um membro da família, já falecido, "exerceu cargos de relevo em Beja, nomeadamente na câmara", e, "ao que tudo indica", terá sido através dele que as cartas "terão sido levadas para a família".

Paulo Arsénio lembrou que a autarquia enviou um ofício à Procuradoria-Geral da República a pedir para se investigar a autenticidade e a legitimidade da posse das cartas.

Na sequência do ofício, a PJ fez uma perícia que concluiu que as cartas são autênticas e o MP “entendeu” que deviam estar na posse da autarquia.

A Câmara de Beja foi “chamada” pelo MP “a recolher as cartas”, o que fez, em abril de 2021, e, depois de as digitalizar para arquivo no município, entregou-as no Arquivo Distrital de Beja, a título de depósito, em janeiro deste ano, contou.

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