Festival Terras Sem Sombra com mais de 40 atividades em 2025
As Filipinas são o país convidado do Festival Terras Sem Sombra (FTSS) que tem início no próximo fim de semana em Arraiolos e decorrerá até dezembro, em 14 concelhos alentejanos, dois ribatejanos e outros dois em Espanha.

Na apresentação desta 21.ª edição, na embaixada das Filipinas, em Lisboa, o presidente do FTSS, José António Falcão, realçou a descentralização cultural do certame, fora dos grandes centros urbanos, e que percorre os quatro distritos do Alentejo, que representa cerca de um terço do território nacional.
Os responsáveis do festival não esconderam “momentos de fragilidade” que o FTSS viveu, nomeadamente pela falta de apoio da Direção-Geral das Artes (DGArtes) no concurso anterior do Programa Sustentado, o que não aconteceu este ano, tendo conseguido financiamento na modalidade bienal, no valor de 60.000 euros, “o que permite planear melhor” e “pagar as contas”, disse à Lusa a diretora executiva, Sara Fonseca. No próximo ano o Festival prevê apresentar uma ópera encenada.
A edição deste ano tem como tema “Autoras, Intérpretes, Musas: O Eterno Feminino e a Condição da Mulher na Música (Séculos XIII-XXI)" - a mulher à qual Falcão se referiu como “uma multidão que compôs em silêncio quando as convenções sociais assim o impunham, muitas vezes tendo que fazer passar as suas obras como tendo a autoria de outros, alguém que inspirou e criou obras eternas, mediando entre a partitura e a alma humana, alguém que, sendo enaltecida e mitificada, deu corpo e serviu de argumento a algumas das mais belas criações da arte musical”.
“A mulher desempenha um papel absolutamente fundamental neste âmbito, mas isso ainda continua a não ser suficientemente conhecido e reconhecido. É também contra um preconceito muito arreigado que a presente edição do festival se ergue, procurando mostrar como ele não possui qualquer fundamento”, acrescentou.
A 21.ª edição, que se cumpre este ano, traz o regresso dos Prémios Terras sem Sombra, que foram suspensos durante a pandemia de covid-19, em 2020, a participação de um novo concelho alentejano, Sousel, dois ribatejanos, Coruche e outro a anunciar “em breve”, e dois municípios espanhóis, um na região da Extremadura, e outro nas Astúrias. Em 2019, o Festival já marcou presença em Olivença.
O FTSS mantém a estrutura habitual, dividindo-se em três partes, além da Música, o Património, e a Biodiversidade, e prevê a realização de “mais de 40 atividades”, disse José António Falcão.
Sousel, que se estreia este ano, vai apresentar, na área da biodiversidade, uma “cenoura que é única no mundo”, referiu Sara Fonseca.
O crítico musical Juan Ángel Vela del Campo, que assegurou a direção artística na últimas edições, reformou-se, “mas continua a ser um amigo do Alentejo e do Festival”, e contou com o “apoio” da soprano Carla Caramujo. Mas a partir de agora "a direção artística está em aberto”, disse Sara Fonseca.
A escolha das Filipinas como país convidado resulta de um trabalho de cerca de uma década do festival com este país asiático, “o que vai permitir ir ao encontro não só de outros aspetos do património musical desse vasto país, com raízes sonoras muito diversificadas, mas também receber intérpretes de grande valor artístico”, disse José António Falcão.
Para o embaixador filipino em Portugal, Paul Raymund Cortês, este é um “encontro de irmãos” e a oportunidade de dar a conhecer melhor a música e os artistas do seu país.
Cortês referiu as muitas ligações entre os dois povos, desde logo a chegada do navegador Fernão de Magalhães à ilha de Cebu, em 1521, onde morreu, mas foi mais longe, recordando as analogias entre o fado e a “kundiman”, música tradicional filipina, que “tem os mesmos temas, estrutura musical e é tocada e soa de forma idêntica”, argumentou.
A participação filipina é garantida pelo “mais famoso coro feminino do país”, Philippine Madrigale Singers, sob a direção do maestro Mark Anthony Carpio, o pianista Raul Sunico, os Song Weavers (Uivers) Philippines e um espetáculo de música e dança tradicionais.
Ferreira do Alentejo, a segunda etapa deste festival itinerante, contará com um desfile de moda filipina, com peças e acessórios reciclados.
A soprano filipina Antoni Mendezona acompanhada ao piano por Nuno Margarido Lopes abre o Festival, no próximo fim de semana, em Arraiolos, com um programa que conta com peças de Manuel Velez, Vianna da Motta, Ernesto Halfter e Francisco de Lacerda.
O cartaz artístico deste ano vai contar com a Orquesta de Câmara de Siero, das Astúrias, na estreia no Alentejo dos “Royal Fireworks”, de Haendel, em Beja, sob a direção do maestro Manuel Paz, do Trio Berenson, do ensemble de Oviedo, do Coro della Farnesina, de Roma, composto por vozes femininas; e do pianista checo Ivo Kahánek, que Falcão apontou como “referência da música da Europa Central”.
Do cartaz faz ainda parte o ensemble ítalo-polaco Giardini di Delizie, composto por elementos femininos, do coro feminino, Collegium Musicum, de Belgrado, dirigido por Dragana Iovanovich e o do duo constituído pelas violinistas Camille Bighin e Asilkan Pargana.
Entre os nomes portugueses nesta edição do Festival estão a soprano Carla Caramujo e o ensemble La Nave Va, sob a direção do maestro António Carrilho, a Orquestra da Costa Atlântica e o Ensemble Bonne Corde, dirigido por Diana Vinagre.
Referindo-se ao FTSS, José António Falcão afirmou: “O nosso objetivo é garantir uma temporada musical regular e qualificada ao Alentejo, algo que tem de existir em qualquer região evoluída da Europa; trata-se, no fundo, de um serviço público, que aqui apresenta a particularidade de assentar na sociedade civil, coisa de que nos orgulhamos, num país onde isso não é muito usual”.
Falcão assinalou “a pequena equipa técnica de nove pessoas que dão o melhor do seu profissionalismo, mas tem também um apoio essencial em algumas dezenas de voluntários que, ano após ano, conferem estabilidade a uma estrutura que pressupõe” a “vasta rede de parcerias", que realçou, "envolvendo municípios, serviços descentralizados do Estado, freguesias, fundações, associações, misericórdias, paróquias, empresas e, cada vez mais, famílias”.
Reconhecendo dificuldades em anos anteriores para apresentar o Festival nos vários municípios alentejanos, Falcão traçou metas para o futuro: “Gostaríamos de poder continuar este trabalho e estendê-lo agora às crianças, aos jovens e às famílias, pensando sobretudo nas comunidades migrantes que têm vindo a estabelecer-se entre nós”, dando como exemplo a colaboração da jovem pianista húngara Kinga Samogyi.
Outro projeto em perspetiva é relativo às “questões relacionadas com o diálogo intercultural e inter-religioso, que a música deveras propicia”, realçando a colaboração do Centro Rei Abdullah Bin Abdulaziz para o Diálogo Interreligioso e Intercultural (KAICIID).
Falcão afirmou-se confiante em que "a Música, o Património e a Conservação da Natureza iluminem um Portugal mais justo, mais responsável e mais solidário e, principalmente, que nos tragam a todos um pouco de alegria e estabilidade num mundo que aspira, acima de tudo, à paz".