A criação artística, intitulada “Eu Fêmea”, é da companhia Teatro do Mar, e é apresentada em três sessões diárias, de 20 minutos (21:30, 22:00 e 22:30), no quintalão do Castelo de Sines, no centro histórico da cidade do litoral alentejano.

A produção reflete sobre “a herança física, cultural e espiritual” da mulher, disse hoje à agência Lusa a encenadora e diretora artística do Teatro do Mar, Julieta Aurora Santos.

A ideia para o espetáculo surgiu durante um “trabalho de investigação sobre o papel da mulher na história”, que pôs a descoberto “a sua invisibilidade em tudo o que é registo histórico”, acrescentou.

“A mulher foi remetida para a esfera privada”, onde não existem “registos históricos”, apenas “sobre a esfera pública que sempre foi ocupada pelos homens, os únicos com acesso ao conhecimento”, disse.

A “humanidade perdeu muito pelo facto disto ter acontecido, se pensarmos quantas mulheres geniais podem ter ficado asfixiadas no silêncio das suas casas, tomando apenas conta das suas famílias”, observou a encenadora.

No espetáculo, o público é desafiado a entrar numa “estrutura circular”, simulando um 'peep show', composta por “20 cabines individuais”, onde cada pessoa é convidada “a colocar uns auriculares” e a “vivenciar a experiência de visionar o que acontece lá dentro, num registo completamente intimista”, explicou.

“A atriz que está dentro da estrutura não tem qualquer contacto físico ou visual com o público, o que torna a experiência muito particular para ambos”, frisou Julieta Aurora Santos.

Para a diretora artística da companhia de teatro sineense, continua a fazer “sentido falar sobre a invisibilidade feminina”.

“Infelizmente, ainda há diferenças muito substanciais do papel do homem e do papel da mulher, na sociedade ocidental, para não falar de outros universos e culturas onde a mulher é completamente asfixiada”, argumentou.

A questão da invisibilidade da mulher “também está ligada à história do véu, da cobertura do corpo da mulher e o corpo como objeto de vergonha”, sublinhou.

O espetáculo, sem texto, “é uma performance física” que procura “evidenciar que [as mulheres] têm de estar cobertas, silenciadas”, assim como “a necessidade de libertação e afirmação de alguém que é um sujeito, independentemente, do género a que pertence”.

Associados “ao erotismo e à pornografia” na história recente, os 'peep show', “eram, na verdade, no século XVII, espetáculos que aconteciam em caixas de dimensões diferentes”, para as quais “as pessoas espreitavam através de janelas”, sendo “apresentadas em espaço público”, como feiras e praças, contou a encenadora.

“Foi um verdadeiro desafio trazer um universo tão intimista como este para o espaço público, mas também nos pareceu interessante que o espetador possa ter a possibilidade de assistir a uma performance com total foco e sem desvio de atenção”, concluiu.


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