“Gostaria de voltar, mas não sei o que irá acontecer”, pois, “espero e desejo ver um Afeganistão onde a democracia prevaleça”, diz à agência Lusa o pintor afegão, de 40 anos.

Kaihan Hamidi, a mulher e os dois filhos menores, um menino de 12 anos e uma menina de seis, chegaram a Beja em março deste ano, depois de terem deixado o Afeganistão em outubro de 2021, com passagens por Doha, no Catar, e por Lisboa.

“Portugal deu a oportunidade” para “alguns ativistas de arte deixarem o Afeganistão”, através do Instituto Nacional Afegão de Música, “e eu fui incluído na lista, como colaborador desta instituição”, conta.

Para trás, deixou o seu país, governado pelos talibã desde agosto de 2021 e já sem a presença de militares dos Estados Unidos da América (EUA).

“Nessa altura, a vida passou a ser fora do normal” e “eu passei a estar em reclusão, lutando para não me meter em problemas”, evoca o afegão.

Para o artista, a saída dos militares norte-americanos e a subida dos talibã ao poder foram “um desastre” para o seu país.

“A esperança e a aspiração desapareceram, os jovens em geral já não têm sonhos” e “todos pensam em abandonar o país”, afiança.

Natural da província de Ghazni, no centro do Afeganistão, Kaihan Hamidi nasceu no seio de uma família numerosa e as artes sempre foram a sua paixão “desde criança”, relata à Lusa.

Em Cabul, capital do Afeganistão, em cujo meio artístico era conhecido como “Deus das aguarelas” (“God of watercolors”, em inglês), chegou a ter a sua própria galeria de arte, durante oito anos, e “ao lado recrutava e ensinava estudantes”.

“Infelizmente, devido à falta de um local adequado e às ambiguidades e acusações que nos poderiam ser feitas, não pudemos prosseguir”, justifica.

Os últimos tempos que passou na capital do seu país foram dedicados ao projeto de conceção do primeiro carro desportivo produzido no Afeganistão, promovido por uma empresa liderada por um sobrinho.

Uma ambição que acabou por não se concretizar, devido à chegada dos talibãs ao governo.

“Faltavam apenas quatro ou cinco meses para termos o protótipo acabado”, mas “todos nós, apesar de separados e em países diferentes, mantemos vivo o sonho de terminar este projeto”, garante.

Após conseguir deixar o seu país, Kaihan Hamidi diz ter recuperado a tranquilidade em Beja, cidade onde foi acolhido pela Santa Casa da Misericórdia e onde afirma sentir-se “em casa”.

Grande parte dos seus dias é passada a pintar aguarelas, sobretudo da torre de menagem do Castelo de Beja.

“Pouco a pouco, vou ganhando um sentimento de pertença a esta cidade. A adaptação tem sido muito fácil, apesar de tantas diferenças culturais, e o único problema que temos é a língua. Caso contrário, é como se vivesse entre o meu próprio povo”, conta o pintor.

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